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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A juventude quer viver!

“Tem dias que a gente acorda
Com medo de sair e morrer
Milícia tá solta na rua
Homicídio só faz é crescer

E preto pobre na rua
Não sabe mais que fazer
Já tem que enfrentar o racismo
E lutar para sobreviver

 É o extermínio da juventude
É o pobre preto do favelão
A gente quer outro modelo
Pro negro ser um cidadão”

Nos dias 29 e 30 de novembro, a Juventude de diversos municípios do Rio Grande do Norte, de diversas organizações, se reuniram no IV Seminário sobre Realidades Juvenis, para discutir e planejar ações de enfrentamento ao extermínio da juventude e pressionar o poder público a aderir ao plano Juventude Viva, do Governo Federal.


 O extermínio da juventude é um tema que atinge a vida de milhares de jovens no Brasil. Percebemos no entanto que essas pessoas que passam pelo processo de extermínio, tem gênero, cor, idade, classe social e endereço. Reconhecemos portanto que nossas ações e discussões devem estar voltadas para diminuir o número de homicídios contra homens jovens, negros, pobres e da periferia dos grandes centros urbanos.


O Plano Juventude Viva traz ações que tentam diminuir a vulnerabilidade dos jovens a situações de violência física e simbólica, com foco nos municípios que apresentam os maiores índices de mortalidade no país. Para que isso aconteça, as prefeituras deverão aderir ao plano, coisa que ainda não aconteceu em Natal, por exemplo.

Durante o seminário, os grupos e organizações presentes puderam trocar experiências de ações, e trabalhos que contribuíram e continuarão a contribuir no enfrentamento à violência. O Levante Popular da Juventude, deu sua contribuição, enfatizando a necessidade de organização juvenil, principalmente a organização da juventude das periferias, como um meio de pensar saídas a partir da vivência e da experiência desses jovens, e para que as mudanças que queremos possam surgir cada vez mais dos guetos, favelas e periferias.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

NEGRA.



Nasceu. Nossa, bem escurinha, né? Isso é porque é pequena, vai clareando com o tempo. Olha esse cabelo, parece que é daqueles de pipoquinha. Mas num se preocupa não, é grosso e forte, vai aguentar alisamento. Olha, como tá grandinha. Só sabe brincar de paquita. Chora não, filha. Suas amigas não são melhores que você, só porque parecem mais com as paquitas. Nem são mais as princesas da Disney que você. Você também é uma princesa. Vai pra escola? Boa aula. O que foi? Te chamaram de macaca? Falaram que seu cabelo era ruim? Que o seu nariz é achatado? Que você era diferente? Chora não, filha. Ah, você quer alisar o cabelo? Mas só tem 9 anos. Olha, o cabelo dela partiu, quebrou, torou. Teremos que cortar bem curtinho. Chora não, filha. Olha só, já tá uma moça! Cresceu rápido, não é? É uma bela negra. Um pecado. Olha o jeito que ela dança, tá pedindo... “ai, se eu te pego neguinha...” Não pode usar essa roupa, você quer aparecer, é? Coloca essa cinta para emagrecer. Você nem parece as modelos na passarela. Olha essa revista, tem truques de maquiagem para afinar os traços. Mas não é que você seja feia, é uma beleza diferente. Exótica. “Fiu, fiu... que morena, viu?” Esse quadril deixa as roupas tão deselegantes.  Olha, o cabelo dela partiu, quebrou, torou. Não dá para você trabalhar aqui, não se encaixa nas necessidades da empresa. Não dá para você trabalhar aqui, estamos procurando outro perfil. Você pode até trabalhar aqui. Só alisa esse cabelo. Só esconde esse quadril. Mas ela não é negra, né? É Moreninha. Só não usa essas estampas. Essa meia calça afina a perna. Não pode parecer uma macumbeira. Só Jesus salva!  Olha, tá grávida. Mas só tem 17 anos. Eu sabia... não tem quem aquiete o facho dessa neguinha. Irresponsável. Inconsequente. O pai? Não importa. Abriu as pernas, que aguente. Agora que ela tava se aprumando na vida com emprego... estragou tudo. Depois reclama que não dá certo na vida. Mas dizem que o pai é mais clarinho... pelo menos a criança pode até nascer bonitinha. Eita, que barriga grande. Daqui a pouco vai nascer. Nasceu. Nossa, bem escurinha, né?

ATÉ QUANDO, NEGRAS...?

Flávia Maria

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

SOMOS O LADO NEGRO DA FORÇA





 “Toda historia da sociedade humana até hoje é a historia da luta de classes”, que nos dias de hoje, se traduz como a burguesia e proletariado, dois grandes grupos opostos que hoje carregam a particularidade de simplificar o antagonismo entre eles, mas não é exatamente, e é ao mesmo tempo exatamente o que queremos falar.
Reconhecemos a luta de classe como algo central para a nossa organização e compreensão social, é o nosso sul, mas hoje queremos enegrecer um pouco mais esse entendimento, queremos dizer porque é necessário nos afirmarmos como o lado negro da força e não só como proletariado, mas como proletariado que tem cor. 
A permanência da luta de classe nos sustenta em uma leitura histórica, mas não pode nos tirar da mente o povo negro como um fator que acirra essa disputa e a torna com cor para além da classe.
Somos 55% de nossa população, que se escondem nos lugares mais distantes de nossa cidade e nos empregos invisíveis, somos os corredores que não se vê, somos o canteiro de obras que atrapalha o trânsito e o percorrer de seus carros, na esperada da “magnífica copa”, somos as mães de seus filhos e nunca dos nossos, somos os cachos obrigados a escorrer e nunca permitir a beleza das voltas, somos os narizes que grandiosamente se espalham pelos nossos rostos e que por vezes são obrigados a se conter, somos os quadris deselegantes, somos o sinônimo do ruim do mal cheiro, somos 60,9 % das empregadas domesticas,somos aqueles e aquelas que o viver é uma historia de resistência.
Mas e a tal da igualdade, aquela que está no “livro das importância”? Essa daí foi colocada de goela abaixo, e sem dó, e o que parece é que não vingou. Porque antes de “sermos miscigenado”, somos uma cor, um cabelo, que chega antes de tudo, antes de nossa fala, de nosso olhar... Temos um lugar na geografia de nossas cidades, que não obedece a um critério de igualdade. 
E se essa é a igualdade de que tanto se fala, nós não queremos! Queremos não senhor! Queremos mesmo é a diferença, o plural, mas nunca o superior, o melhor o mais.
Nesse tempo de “igualdades”, de “miscigenação”, de “democracia racial”, vivemos o tempo de Michele Borges, que afirmou que as médicas cubanas tem cara de domesticas, vivemos a chance de um adolescente negro ser assassinado de 3,7 vezes maior em comparação com os brancos. 
Uma igualdade, onde a taxa de homicídios de negros é de 36,5 por 100 mil habitantes, no caso de brancos, a relação é de 15,5 por 100 mil habitantes, e nas universidades, historicamente construídas para a classe dominante, somos apenas 8,7 dos estudantes universitários.
Por isso de nada vale os grandes esforços e estudos para explicar a violência com suas diferentes escalas, se não olharmos para o nosso passado “obsclaro”, que nos impôs um desenvolvimento, um bom costume e uma cultura que nunca tiveram espaços para os nossos orixás, ou para as nossas ladainhas de capoeira. 
Nada adianta enormes estudos e discussões se não percebemos as cores de nossos presídios, de nossas universidades, de nossos deputados federais, juízes e médicos. É preciso escutar os sons dos tambores, ver os grafites de nossos muros, escutar as letras de nossos samba, rep e ladainhas, é preciso escutar vozes negras que nunca se calaram, precisamos escurecer nossas concepções.
Diferente dos não negros, temos que nos pensar enquanto corpo e não só enquanto classe. O mundo não está dado para nós, não temos a cor, o cabelo e o corpo que ele exige, e os nossos dias são um intenso martírio de nos transformar e esconder o que somos. Mentimos onde moramos para conseguir emprego, nos transformamos diariamente, não no branco, porque isso não conseguiríamos, mas no moreno, no marrom bom bom ou cor de caramelo.
Queremos mesmo é pluralizar a nossa historia e acabar com a sua palidez, enegrecer os corpos dos nossos livros de ciências e escurecer nosso heróis e nossas universidades. Não queremos privilégios, mas o direito da existência do plural, que historicamente nunca nos foi possível.
Jéssika Rufino

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

A perversidade da democracia racial


Pare e olhe para a base
Fundamentos fundadores, alicerces criadores da história do Brasil.

Nós somos um cadinho de raças? Nós somos uma democracia racial?
Como pode a “democracia racial” aparecer em um país que não tem tradição de democracia política?


Há discursos que se apresentam propositalmente com espaços em branco, com lacunas, que são emitidos por sujeitos inseridos em um lugar definido no modo de produção, partem, portanto do social e político (em um sentido de relação entre sujeitos) para fala sobre o social e a política, mas que negam seu ponto de partida: as relações sociais. Esses discursos se originam da projeção do real na consciência de uma classe, e por isso representam o modo como essa classe enxerga o mundo que vive e as relações entre o homem/mulher-natureza e entre o homem/mulher-homem/mulher.
Esse discurso que não se reconhece objeto de trabalho de um sujeito costuma ser uma representação invertida da realidade, a aparência que se apresenta como essência, e a causa que se mostra como efeito, o cindido que se revela coeso. Se apresentando como discurso sobre o social e sobre o político sem partir desses campos, ele pode aparecer como universal, mas não passa de uma abstração por não considerar a sua origem concreta.
É ele que justifica a dominação de parcelas sobre a totalidade, ele quem dá um papel ativo na história daquilo que é eminentemente passivo, é ele quem silencia povos, raças, e classes, ele quem justifica uma ordem de exploração. A aprovação das cotas raciais para o ensino superior brasileiro trouxe à tona a discussão sobre a existência ou não de raças, e de um fantasma que ronda as periferias e centros de nossa sociedade: o racismo.
Claro que a América Latina tem uma posição peculiar em toda essa discussão, aqui foi o solo em que estiveram presentes povos das mais distintas regiões do mundo. Exatamente por isso se disseminou o pacífico discurso do encontro de mundos, da miscigenação, e é exatamente o Brasil quem mais assume essa “identidade” de povo misturado, da mais profunda harmonia entre as raças. Mas nesse momento é preciso abandonar as certezas, a superficialidade das aparências e do senso-comum, para descobrir a origem do discurso da democracia racial.
Partimos aqui de um pressuposto: a existência de raças. Por mais que pesquisas tenham avançado no sentido de reconhecer que as diferenças entre um negro, um branco e um índio, não ultrapassam alguns poucos fenótipos (em um referencial biológico), e que no geral as capacidades entre todos eles são as mesmas, o que nos interessa aqui não é a biologia, a matemática ou a física, mas as manifestações das relações humanas, sociais, e ao longo da história da humanidade se produziu diferenças raciais e étnicas, seja no que tange às manifestações culturais ou do papel de cada uma na sociedade.
Mas se ainda houver persistência quanto à inexistência de raça, respondamos algumas perguntas: Quantos negrxs e índixs ocupam cargos no judiciário? Quantxs sentam ao lado de branxs nos assentos das universidades? Qual a cor dos sujeitos que são obrigados a usar o elevador de serviço? Quantxs negrxs e índixs ocupam cargos no legislativo? E no executivo? Qual a cor da pele dxs moradorxs das favelas? A resposta a cada questionamento desses evidencia que a crença na existência de raças nos trouxe consequências pesadíssimas que não se desfaz pela descoberta científica de sua inexistência, ou pela palavra sem ação.
A ideia de encontro entre culturas de miscigenação que se espalhou fortemente pela América Latina oculta o ponto crucial na discussão, que na sua história houve na realidade um choque forçado entre culturas, e a dominação de um projeto de sociedade, de uma concepção de mundo sobre outros. Na realidade, a fundação do Brasil e dos demais países latino-americanos na história do centro tem como base o genocídio e a transformação de indivíduos em mercadoria, não em um ponto de vista meramente filosófico, mas material, o ouro e a prata que entupiram os cofres dos bancos europeus, o tecido que vestiu a nobreza francesa e o operariado alemão teve sangue, de fato, negro e indígena, foi no sacrifício de povos inteiros que se ergueu o império europeu.
A história da América Latina desde 1492 é assombrada pelo mito da superioridade de uma raça sobre outra, e pela dominação material e espiritual de vários povos de origem distinta. Seria meramente coincidência que em nossas escolas se ensina o idioma do conquistador? Será que nesse encontro harmônico entre raças se decidiu pacificamente o idioma oficial dessa terra? Será que todos, pacificamente, decidiram que os filhos dos europeus passariam a ocupar os cargos de poder em cada país latino-americano? Será que foi na comunidade argumentativa, entre iguais, em uma verdadeira democracia racial que se definiu que negrxs e indígenxas serviriam a casa dxs brancxs?
E assim revela-se o caráter ideológico da “democracia racial” da miscigenação harmônica no solo latino-americano, que oculta uma realidade social de fato dividida racialmente. A emancipação humana em solo brasileiro necessita que seja feita um recorte racial, exige que se interrompa o genocídio histórico da juventude preta que nos perguntemos o motivo real da maioria da população carcerária ter pele escura enquanto a universitária tem pele clara, que se reinicie a redistribuição de terra para o povo indígena, e que superemos o mito da construção pacífica da identidade latino-americana miscigenada, e que fique a mostra o projeto de dominação de um povo sobre outro que imperou em nosso solo.

Povo preto unido é povo preto forte
quem não teme a luta,
quem não teme a morte!