sexta-feira, 23 de outubro de 2015

São tempos difíceis para os sonhadores, mas nada é impossível



Desde que assisti pela primeira vez O Fabuloso destino de Amelie Poulain soube que nenhum outro filme conseguiria captar a essência do que sou por dentro e do que se passa na minha cabeça. Mas nesses quase sete anos desde a primeira vez que assisti a obra, nenhuma cena faz mais sentido do que a que a personagem Eva, interpretada por Claude Perron, solta a frase “os tempos são difíceis para os sonhadores”. 
Como uma boa adolescente era indignada com tudo que havia de errado nomundo, depois de amadurecer percebi que minha indignação não era vazia, ela tinha um gênero e uma classe. Depois de muito matutar percebi que o lugar da minha raiva pelos males do mundo era a rua, me organizei no Levante Popular da Juventude e na rua me joguei e desde então não saí mais. Já são quase quatro anos e sinto que o mundo está se desfazendo sob os meus pés, de um lado, redução da maioridade penal, do outro tem a aprovação do “estatuto da família”, na minha frente o PL 4330 da terceirização, atrás de mim uma contrarreforma absurda, embaixo de mim criminalização dos movimentos sociais, e agora, acima da minha cabeça a aprovação do PL 5069 que torna crime ajudar uma mulher a abortar (não estamos falando nem da legalização do aborto, mas de ajudar inclusive mulheres que foram vitimas de estupros a conhecer seus direitos). Sinto que morro um pouco mais cada dia, e sei que meus assassinos tem nome e endereço. Eles se organizam nas bancadas da bala, do boi e da bíblia, e esse grupo tem como mestre o pior câncer que o país já teve: Eduardo Cunha! 
Não é possível que um ser (não humano) tenha a capacidade de retroceder tanto os direitos da classe trabalhadora, que tenha tanto dinheiro desviado na Suíça, que atinja mulheres, lésbicas, negras e negros, gays, transexuais, travestis, bissexuais, juventude e saia impune, que continue fazendo a linha bom moço. Não é possível aceitar calada e de cabeça baixa enquanto uma só pessoa destrua tudo que tantas outras lutaram para conquistar! 
A realidade se faz dura, sangrenta e cruel. “Os tempos são difíceis para os sonhadores”, mas nós, somos justamente as pessoas que ainda ousam sonhar. Não devemos parar de sonhar, pois se colocar como sonhadora nessa conjuntura é se colocar a serviço da luta, pois de que servem os sonhos se não para fazer com que nossas ações aconteçam e nos façam alcança-los? De nada servem os sonhos na cabeça, precisamos que eles deixem de serem sonhos e tornem-se vida. Eu sonho com uma nova sociedade, feita por novas pessoas, por mulheres e homens e nenhum Cunha. Meu sonho é meu projeto politico de vida, crer em dias melhores me faz lutar.

E você, vem sonhar comigo?

Ana Lucia Lima - Levante Popular da Juventude RN

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Sobre o Lançamento do relatório final da Comissão da Verdade na UFRN


            Em 2012, nós do Levante Popular da Juventude executamos uma proposta bastante ousada: realizamos ações simultâneas em várias capitais do país de escrachos aos torturadores que atuaram na ditadura militar e continuam impunes. Essa ação foi responsável pela nacionalização do movimento, bem como cumpriu importante papel de impulsionar a Comissão Nacional da Verdade. Carregamos desde o nascimento o orgulho de continuar a luta de muitos que tombaram, inclusive jovens,  e levantando a bandeira da Memória, Verdade e Justiça.

            Reconhecemos a grande importância dos trabalhos da CNV no resgate de um dos períodos mais obscuros da história nacional, bem como das comissões da verdade da OAB-RN e da UFRN. Em especial esta, que hoje faz o lançamento das conclusões de seus trabalhos por meio da publicação do seu relatório final. Por isso, parabenizamos a nossa comissão pela dedicação no resgate e esclarecimento de passagens da história local como a morte de dois estudantes da casa, José Silton Pinheiro (a quem homenageamos nomeando o nosso DCE), 23 anos, e Emmanuel Bezerra dos Santos, 26 anos, além do professor Luiz Ignácio Maranhão, afinal "um povo sem memória, é um povo sem história" (Helena Pignatari).

            Neste dia 14 de outubro de 2015, nós estudantes e toda a comunidade acadêmica desta universidade viemos aqui propagar que "Ditadura nunca mais!", tal qual fica gravado hoje em nossa própria reitoria. Ter esses dizeres aqui afixados, mais que simbólico, se torna um necessário ato de resistência. Necessário em face das diversas manifestações facistas que frequentemente ainda presenciamos nesse país, por pessoas que conclamam nova intervenção militar e saúdam, pedindo o retorno de, uma passagem devastadora da história brasileira.

            Infelizmente ainda hoje sentimos as heranças da ditadura, seja na forma truculenta com que ocorre a abordagens polícias, principalmente no campo e nas periferias de nossas cidades - as quais deixavam desaparecidos políticos antes, mas agora deixa vazio nos lares de milhares de jovens negros e pobres todos os dias; seja nas posturas autoritárias que temos observado em nossa câmara federal, autoritária em colocar para reapreciação votação de proposta de redução já reprovada, contrariando próprio regimento da câmara. Também em trazer para ordem do dia projetos que relembram os atos institucionais da ditadura militar, como o projeto anti-terrorista, o qual acaba por deixar a crivo de delegados e promotores determinar a ilegalidade de condutas como manifestações, correndo o risco de ter movimentos sociais enquadrados nessa lei.

            Além disso, está completando um ano que um estudante da UFRN foi brutalmente agredido por seguranças da universidade. Não bastou videos, fotos, testemunhas, mas na pauta do CONSAD consta a “suposta agressão sofrida por estudante”. É de se lamentar que a mesma UFRN em que se publica como houve perseguição ideológica a estudantes na ditadura, a que tinha um órgão investigatório - do qual nos envergonhamos(!) -, como a ASI, que fazia o patrulhamento das atividades da comunidade acadêmica, professores, servidores e estudantes; é a instituição que está perseguindo e coagindo jovens militantes da universidade após a ocupação da reitoria em 2014 sobre aqueles casos de violência interna. A que instaura sindicância com posturas bastante autoritárias contra seus próprios estudantes, acusando-os pelo "crime" de lutar por uma universidade mais democrática, com menos marcas de uma ditadura que, dolorosamente, ainda perdura até os dias atuais! Uma violência institucional que tolhe a liberdade de uma juventude que só agora consegue se organizar, ávida por transformações que tornem verdadeira a nossa tão suada democracia.

Mas não nos calaremos. Diante de toda opressão institucionalizada, de toda pressão para que entreguemos nossos companheiros de luta, de toda herança dolorosa, nós não esqueceremos e continuaremos lutando para que não se repita, "para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça!"

LEVANTE POPULAR DA JUVENTUDE - RN